Em Espanha "estão a cair os peixinhos, faltam os tubarões"
O que está a acontecer na política espanhola com tantos casos de corrupção agora conhecidos?
Acho que é a demonstração de que as regras do jogo que serviram no início da transição [espanhola], para fortalecer os partidos, acabaram por ter um efeito perverso. Por um lado, a usurpação pela elite política dos direitos de representação política dos cidadãos e, por outro, cultivou-se a corrupção.
Porque é que acha que os outrora intocáveis estão a cair agora nas mãos da Justiça em Espanha?
Eu penso que não estão a cair os verdadeiramente intocáveis. Por agora estão a cair os peixinhos, faltam os tubarões.
E acha que vão cair?
Tenho as minhas dúvidas porque o outro grande problema da política espanhola é a falta de independência do poder judicial. Os juízes que querem ascender sabem que dependem dos comissários políticos que os partidos põem nas instâncias judiciais. Não são independentes.
Como se pode pedir aos espanhóis que acreditem na política?
Há tempos que não há ninguém com talento e mérito dedicado à política, contrariamente ao que aconteceu no início da transição [para a democracia]. Nessa altura, as mais ilustres personalidades pensavam que podiam contribuir com alguma coisa para o interesse geral. Agora os que se dedicam à política são profissionais só da política. Jovens que têm um currículo dentro do seu partido. Como é o caso de Rodríguez Zapatero ou de Rajoy. Não sabem o que é uma empresa, os pagamentos ao fim de mês e os problemas reais. São burocratas do seu próprio partido.
Acha que há diferença de tratamento entre os implicados nos diferentes casos de corrupção?
Creio que há um caso que chama muito a atenção: o tratamento especialmente implacável que está a ter o ex-tesoureiro do Partido Popular Luís Bárcenas, que está há um ano e meio em prisão preventiva. É singular porque a prisão preventiva deve ser justificada por perigo de fuga ou manipulação de provas. Bárcenas não é um prisioneiro, mas sim um presidiário que interessa à política. Nos Estados Unidos já teriam proposto um acordo em troca de dar os nomes de todos os envolvidos.
Os meios de comunicação estão a investigar bem estes casos ou há também muito interesse dos partidos por detrás?
Existe uma certa autocensura nos media porque todos eles estão numa situação de grande debilidade económica. Estão condicionados pela concentração entre o poder político e o económico. Não é uma coincidência que quase ao mesmo tempo fossem substituídos os diretores do 'El Mundo', do 'El País' e do 'La Vanguardia'. Cada um por diferentes motivos, mas penso que há mais alguma coisa além da coincidência. A situação de debilidade económica nos media permite ao poder político ter mais áreas de impunidade e conseguir reduzir as críticas.